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Ma. Viviane Rodrigues

"12 ANOS DE ESCRAVIDÃO": UM MANIFESTO QUE SAÚDA A PASSIVIDADE

*Publicada orignalmente na Obvious Magazine.


Não há muito o que dizer, apenas que "12 anos de Escravidão" não é um grande filme. Existem vários desarranjos técnicos: planificações que não se complementam, enquadramentos confusos, edição simplória, atuações excessivas, lentidão narrativa que não se justifica e uma higienização fílmica digna de instituição hospitalar. Além do roteiro não se preocupar com o fechamento da narrativa, é recheado de momentos folhetinescos da pior qualidade. Mas o que mais incomoda mesmo, e absolutamente, é a passividade do personagem principal na obra cinematográfica, Solomon Northup, que não é uma pessoa, mas um robô.




Em 1841, Solomon (Chiwetel Ejiofor)um homem que nasceu livre, vivendo em Nova York, em uma sociedade muito distinta e igualitária (aham!), após aceitar um trabalho em Washington, é sequestrado e vendido como escravo. Solomon - que nasceu livre, como bem me lembrou a ex-aluna Chris Magno que esta lendo a obra - então, precisa superar humilhações diversas para sobreviver (porque isto basta(ria).

Ele é um homem livre, que, ao acordar destratado por um desconhecido e mesmo amarrado, não REAGE.

- Me lembrei de Old Boy, filme de Cham-wook Pack. Spike Lee lançou a versão dele do mangá original das duas narrativas, agora, em 2014.

-

Bem, voltando ao filme, ao longo de doze anos, Solomon, batizado Platt, serve dois "donos", Ford (Benedict Cumberbatch) e Edwin Epps (Michael Fassbender) que exploram a força e o conhecimento de homem livre que ele possui.

O primeiro é um branco "gente boa", mais "humano" e menos "proprietário". Já o segundo é o próprio Satanás de barba ruiva: pedófilo, desequilibrado, violento e covarde.

Então, a gente vai passar duas horas e quinze minutos vendo violências bárbaras... É,... Não aquelas coisas booooobas e banaaaaais que acontecem no cotidiano e nas mídias: a piada, o escárnio, o estereótipo, a violência psicológica que nos infringem todos os dias...Não... Era porrada mesmo. Açoite. Estupro. Sofrimento físico. Entendeu?


Então, a receita do filme é interessante. A solução quando você é cercead@ nas liberdades é: SENTA E ESPERA. O filme é um desfila lento e sádico de :

"Quem ESPERA sempre alcança".

"Os últimos serão os primeiros".

"Deus proverá".

Cantam os personagens da obra no momento em que enterram companheiros: " My soul will rise in heaven, lord."

Ou seja: "A felicidade não é deste mundo.".

Nem um religioso ardoroso contaria tanto com a atenção de Deus.

O filme é uma aula para a apatia, inércia e letargia. TUDO O QUE A GENTE NÃO PRECISA.


Ambrose Bierce disse que a paciência é uma forma menor de desespero, mascarada de virtude e é triste ver em pleno século XXI tamanha exibição de iniquidade. Todos os "abjetos" desta sociedade,todos os que sofrem por conta da diferença e que lutam contra o controle e as formas de repressão social, naquele conceito tão legal e aberto que a Judith Butler ofereceu, sufocamos vendo este filme.

E eu ficava me perguntando: "_Onde estará a dignidade desta pessoa? Gente, cadê a humanidade?

- Claro, claro...Não era a minha pele aquela... Nem era eu vivendo aquelas atrocidades que aquebrantam o espírito, Inanição é a solução? A resposta não é agir?





O filme é um infindável desfile de barbáries protagonizadas por Epps até a chegada do anjo da guarda, Bass, Brad Pitt (que também é produtor do filme) que envia uma carta ao amigo de Solomon. Este amigo então, um branco gente boa, vai RESGATÁ-LO das agruras impostas pelo "proprietário".


Neste meio tempo, Solomon:

ESPERA.

E ESPERA. E vê os companheiros morrerem, serem estuprados, serem subjugados, serem execrados, com pouca ou nenhuma AÇÃO.


ATIVA nesta história somente Patsey (Lupita Nyong´o - a única atuação digna no filme, ao lado de (Michael Fassbender)), que vem e vai entre fazendas; que desafia os limites do proprietário; que quer ter algum tipo -qualquer tipo - de controle sobre a própria vida.

Não há realmente muito mais a se dizer, embora as ilações sobre o que a obra diz sejam muitas - e essa é uma qualidade deste filme, no mínimo, inoportuno - porque nesta ode à ESPERA, se resume assim as tentativas de revolta: "_Nem tente, porque são só niggers sem estômago para lutar."



Que eu lembre, o termo robô tem origem em uma palavra tcheca, robota/robot, um autômato com forma humana, capaz fisicamente, e também, muito importante, OBEDIENTE ao "proprietário". A narrativa do filme nunca fala de um homem livre. Ele sempre foi escravo.



Se quiser ver o racismo discutido com mais vigor,:


"Vênus Negra", de Abdellatiff Kechiche;

"Finding Forrester" Gus Van Sant;

"Selma", Ava DuVernay;

"A Cor Púrpura", Steven Spielberg;

"Entre os muros da escola", Laurent Cantet;

"Sarafina – o som da liberdade", Darrell Roodt;

"Preciosa", Lee Daniels;

"Amistad",Steven Spielberg;

"Uma Outra História Americana", de Tony Kaye;

"Mississipi em Chamas", de Alan Parker;

"Bopha", Morgan Freeman;

"A Última Ceia", de Marc Foster.;

"Faça a Coisa Certa", de Spike Lee;

"Green Book, o Guia", de Peter Farelly;

"Crash, No Limite"; de Paul Haggis;

"Malcom X", de Spike Lee;

"Adivinhe Quem Vem para Jantar", de Stanley Kramer ( embora o filme sofra inúmeras críticas importantes, é um marco)


© obvious: http://lounge.obviousmag.org/nude_but_not_naked/2014/03/12-anos-de-escravidao-um-manifesto-que-sauda-a-passividade.html#ixzz5Ldvl2CEa

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