Primeiro, quero dizer que arquétipo é um conceito complexo, com várias nuances e, embora seja denso - e muito interessante - estou aqui, apenas, pinçando e observando aspectos de forma geral, ok? Vale a pena o aprofundamento de Jung para várias áreas do conhecimento.
Como escrevi no ensaio, o conceito de arquétipo foi elaborado por Jung, na Psicologia Analítica, quando produziu a teoria do inconsciente coletivo, que são ideias pré-concebidas, fundamentadas no senso comum, sobre alguma coisa ou pessoa. É como um tipo de herança mental que nos acompanha. Essas sensações que estão sempre conosco são símbolos, são imagens mentais e pensamentos que todos temos e que aparecem de forma instintiva, através dos arquétipos.
Por exemplo, ao vermos a imagem de um cão, nossa resposta automática é pensar em um exemplo de dedicação, pois ele é sempre descrito como nosso melhor amigo. Sob essa perspectiva, o cachorro é, então, um arquétipo de lealdade - bem como, uma cobra pode ser arquétipo de maldade e vilania; o leão, de força, a águia, de liberdade, etc.
Para Jung arquétipos são, então, imagens elementares albergadas em nosso imaginário, que podem possuir características positivas e/ou negativas, que ajudam, então, a explicar a experiência vivida por outras gerações.
São milhares as possibilidades de arquétipos, e fiz aqui, apenas uma seleção de alguns presentes em narrativas fílmicas.
A Mãe
O arquétipo designa todo o comportamento materno e gentil. acolhedor e compreensivo.
A Persona
Mostra um aspecto que queremos exibir de nós mesmos aos outros. Ela/ele vive aquilo que é esperado socialmente dela/dele e dá muito valor ao que os demais pensam dela/dele.
O Governante
Para ele/ela é imperioso o exercício do poder. É aquele gosta de ter controle sobre tudo - pessoas ou coisas. Pode ser nominado de outra forma: líder, chefe/chefa, rei / rainha, etc. Não é necessariamente um perfil tirânico. Pode ser um/uma líder com grandes responsabilidades, como também pode ser um exemplo de autoritarismo.
O Cuidador
Ajudar as pessoas é seu leit motif. Luta contra o egoísmo e a ingratidão. É alguém muito generoso/a e tem muita compaixão pelos seus pares.
O Indivíduo Comum
Aquele personagem que quer se conectar e fazer parte de um grupo porque não gosta de ser diferente ou teme ser deixado/a à própria sorte.
O Amante
O maior medo desse personagem também é não ser amado/a, mas seu maior interesse é se relacionar com as outras pessoas, pois valoriza a intimidade - e a experiência e sua beleza vai além da versão física.
O Tolo
Se é para viver, que seja o agora, com muita positividade, esperança e alegria, prazer, deixando seu destino para ser decidido, também, pela sorte.
O Herói
O herói (heroína?) é acima de tudo, um corajoso. É o personagem que simboliza a força e possui firmeza de espírito para enfrentar uma situação difícil, qualquer que seja ela. Só teme demonstrar a própria vulnerabilidade.
(Lembramos aqui, quando se trata de narrativa fílmica, sobre a polêmica de arquétipos para mulheres e suas jornadas em narrativas fílmicas. A jornada da heroína, de Maurren Murdock confrontou a jornada do herói, popular e canônica, proposta por Joseph Campbell e pelo guia de Christophe Vogler; a escritora e professora Victoria Lynn Schmidt também propôs um outro viés, e A Promessa da Virgem, de Kate Hundson também oferece uma jornada diferente.
O Rebelde
Vive de acordo com suas premissas e a opinião alheia não lhe interessa. Regras servem para outros não se aplicam a esse arquétipo, completamente avesso a autoridade.
O Mágico
Mistérios, ocultismo, visões, a busca pela compreensão da natureza. É um sábio, um curandeiro.
O Inocente
Pureza na alma, procura sempre fazer o que é certo e teme em agir de forma equivocada e - ser punido. Tem muito otimismo e fé.
O Explorador
A busca é sua marca, por conta de um grande desejo de exploração. Carrega um grande enfado pela vida, quando ela se repete. Estar parado é estar preso.
Veja que interessante: a obra fílmica acima - que recebeu quase a nota máxima para muitos críticos de cinema - recebeu o selo R. Isso quer dizer, como vimos no post sobre a MPA , que não recebe muita atenção e espaço porque é proibido de fazer propaganda em todos os veículos e horários - entre outras severas restrições. Isso impede o filme de ser mais (re)conhecido e transformar o sucesso em dinheiro.
A sinopse? Uma avó feminista lésbica indisciplinada leva sua neta em uma viagem para encontrar dinheiro para um aborto.
"Talvez essa seja a primeira comédia sobre um aborto já realizada. Mas a premissa permite o foco subjacente no legado da libertação das mulheres da década de 1960, e como isso foi filtrado até o presente através de gerações de mulheres, da avó, à mãe, à filha. Lily Tomlin segura o filme com uma performance soberba , onde a personagem é tão refrescante - e tão rara - de se ver na tela. Não é uma pobre velhinha, não é uma idosa maluca e rabugenta, mas uma mulher viva, pensante, desbocada, uma mulher empoderada madura cheia de habilidades e desenvoltura, que se recusa a ser comum ou de segunda categoria e insiste em fazer as coisas a sua maneira, sempre original, não importando o custo pessoal. É um filme muito espirituoso, é claro, como Tomlin realmente é na vida real - parece um papel que ela nasceu para desempenhar" (Alexa Dalby, 2017).
Outro exemplo deste arquétipo:
O Sábio
A busca do sábio é pelo (auto)conhecimento e da reflexão. Analisa tudo e teme a alienação e a ignorância.
A Sombra
É aquilo que temos guardado em segredo, trancafiado em largo cadeado, tudo aquilo que não é moralmente aceito.
O Trapaceiro
Costuma quebrar regras, sendo um astuto que busca ver os limites das autoridades e tirar algum proveito disso.
O Criador
Sempre criativo e inovador, carregando uma mente fervilhante e cheia de ideias.
A Morte
É um despertar, uma oportunidade para uma nova aventura. A morte como representação de um fim para um recomeço.
São vários os arquétipos disponíveis, mas a gente fica por aqui. Deixamos uma entrevista de Carl Jung.
Muita coisa para pensar? Pois faça aos poucos :)
* Este post faz parte do ensaio: A CIDADE DAS MULHERES MORTAS: A VIOLÊNCIA REITERADA CONTRA AS MULHERES NA PRODUÇÃO FÍLMICA E SERIADA. Ele será publicado na obra coletiva 15 anos da Lei Maria da Penha: Avanços e Desafios (Coordenadores: Bruna I. Simioni Silva; Larissa Ribeiro Tomazoni e Paulo Silas Filho).
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