* Este post faz parte do ensaio: A CIDADE DAS MULHERES MORTAS: A VIOLÊNCIA REITERADA CONTRA AS MULHERES NA PRODUÇÃO FÍLMICA E SERIADA. Ele será publicado na obra coletiva 15 anos da Lei Maria da Penha: Avanços e Desafios (Coordenadores: Bruna I. Simioni Silva; Larissa Ribeiro Tomazoni e Paulo Silas Filho).
Primeiro vamos lembrar que um tropo cinematográfico é uma convenção que é usada para se contar uma histórias, baseada em arquétipos. São apoios narrativos, são ferramentas, são suportes usados para expressar ideias ao público - e eles existem aos milhares.
No entanto, se um tropo é repetido a exaustão, ele vira um clichê fílmico.
Exemplos de tropos
Narnia Time - Filmes em que personagens viajam no tempo, mas o tempo lá se passa de forma diferente.
Sequestro é Amor - Primeiro filme que me vem a cabeça é "Sete Noivas para Sete Irmãos", um musical onde seis irmãos resolvem, baseados na história de terror do rapto das Sabinas - a primeira geração de homens romanos teria sequestrado e estuprado as filhas das famílias Sabinas vizinhas - tomariam as mulheres que os interessassem. Nem tenho o que dizer...
Nascida Sexy Ontem é um tropo muito conhecido de quem gosta de cinema . É aquela mulher estonteante, extremamente sensual, que não tem a menor ideia dos desejos que provoca em outras pessoas. Para além disso, é uma personagem muito ingênua e muito infantil.
Marilyn Monroe viveu essa tragédia profissional, por ser obrigada a viver este papel incontáveis vezes. Essa representação acossou-a, inclusive, na vida particular. Na verdade, Marilyn era uma leitora ávida. Na biblioteca pessoal dela haviam clássicos como Dostoievski e Milton, mas também modernos como Ernest Hemingway e Jack Kerouac. Enquanto ela não estava filmando, ela era uma acâdemica na UCLA nas aulas noturnas de Literatura e História. Nada mais natural, então do que ela também escrever, e o fez: eram textos fragmentados, poemas, escritos em cadernos, folhas soltas, finalmente publicados como Fragments: Poems, Intimate Notes, Letters, em 2012.
A leitura revela uma pessoa extremamente sensível aos agentes externos e que pensava sobre si própria e quem estava ao seu redor. Depois de ler você percebe a trágica desconexão entre uma persona pública e a pessoa privada - vulnerável e incompreendida; desejosa de ser vista como ela realmente era.
Ela e Bert Stern (fotos acima são dele) ajudaram a despertar o meu amor pela imagem - inerte ou em movimento - pela fotografia e pelo cinema. Me fizeram perguntar também, quando as mulheres passaram a acreditar que uma cicatriz não é algo próprio e lindo.
No Brasil, passei minha infância e um pedaço da adolescência vendo esse clichê narrativo com o Miéle e a Kate Lyra no programa de TV A Praça é Nossa:
Outro tropo é O Homossexual Depravado e sua Laia. Autodescritivo, esse tropo limitava as representações de personagens explicitamente LGBTTA+ a vilões, desequilibrados, suicidas ou a personagens que não eram muito respeitados na narrativa.
Bury your gays - Personagens queer têm mais probabilidade de morrer do que personagens heterossexuais porque são, geralmente, considerados mais descartados.
Vasquez sempre morre - personagem que representa a butch, tem a morte mais violenta e prolongada. Nome de uma das personagens do filme Aliens - mas nesse todo mundo morre - ops, spoiler hahaha.
Não muito Gay - esse tropo serve para quando a/o roteirista quer esum personagem gay, mas que não seja muito gay. São os namorados LGBTTa+ que não pegam na mão, não beijam e mais parecem colegas de quarto.
Garota com Garota - esse tropo é para garantir a atenção masculina, porque duas garotas namorando são sempre sexy, certo? Claro, pelo "olhar masculino", como ensina Mulvey.
Garotos são garotos- "se ele está sendo mau com você, quer dizer que ele gosta de você". WTF??? Sabe aquele que da chilique por ciúmes; que é violento no dia-a-dia porque não sabem lidar com os próprios sentimentos; os rudes e grosseiros quando não sabem o que dizer, embora bons de coração, etc. "Homens são assim mesmo, certo?" (Errado). Esse tropo é muito comum e está presente em novelas, séries e filmes.
Outros tropos
O Herói Acidental - Um personagem é celebrado pelo seu heroísmo. Ele insiste que não fez nada de especial, mas ninguém acredita. Geralmente prevê duas formas para ser adaptado a narrativa: o herói cometeu um erro que resultou no resgate ou ele estava fazendo algo por si, e acabou salvando o dia.
Um tropo se torna interessante quando cai nas mãos de bons roteiristas, como no caso de Herói Acidental, de 1992, de Laura Ziskin, Alvin Sargent e David Webb Peoples. Infecção por Zumbi - Alguém é ferido, machucado, mordido e manifesta os sintomas. No filme há o tropo Apocalipse Zumbi e tantos outros - porque já sabemos que tropos podem ser costurados para produzir a narrativa, right?
Se você quiser passear por todos os exemplos, um site legal para pesquisar é:
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